.
E agora estava assim... Dera para rastejar os chinelos pela casa, com passos preguiçosos antes mesmo do sol principiar a aparecer no horizonte.
Sentava-se na varanda a divagar, enquanto lentamente o sol nascia, alimentando seus pensamentos, iluminando a sua face, suscitando brilho no olhar. A brisa daquela manhã sempre lhe seria diferente das outras brisas, que vinham somente desvanecer as lembranças do amado, que partira sem o lisonjeio de uma despedida. Aquela misteriosa brisa, gélida e mansa, que impregnava-lhe o corpo enervado de menina, viera cicatrizar as múltiplas chagas   supuradas... Era curativo sem dor.
Há muito que o desamor a sucumbia. Estava enfermiça, taciturna, ofuscada. Deitada na cama, carecia-lhe forças pra se levantar. Mal sabia ele que era seu mal-necessário. A sua partida fora a das piores. Não houve choro nem súplica. Seus gritos tumultuosos estavam imersos em silêncio perturbador, misterioso.
Agora ali na varanda, fascinava-se com as cicatrizes estampadas na pele. O contentamento a invadiu e a fez vestir-se do céu; desfrutar dos raios mornos do sol; acenar à passarada que rabiscara o céu de gritos; ver o desabrochar das margaridas e seus beija-flores. Toda esse movimento incessante da natureza lhe era profuso. Orvalhou-se. Quedou-se no chão com a alegria de toda a dança. Acariciou em seu braço as estampas que o mal deixara. Reverberou-se luz e  vontade insaciável de viver. Não haviam mais dores.                   
Marcadores: , | edit post
0 Responses

Postar um comentário